Ainda
com respeito à história de Matosinhos, cumpre notar sua relação com a
Inconfidência Mineira, assunto estudado por HENRIQUES (2003), que ora
transcrevo:
Matosinhos também teve participação na Inconfidência Mineira, tanto é
que o desembargador José Pedro Machado Coelho Torres e o ouvidor Marcelino
Pereira Cleto ali estiveram a mando do vice-rei Luís de Vasconcelos e Sousa,
dedicando um dia inteiro a inquirir pessoas suspeitas com o levante. Num dos
casos, um pardo de nome Manoel da Costa Capanema, sapateiro, foi preso por
insultar o jovem português Manoel Moreira que morava com a parda alforriada
Josefa Teixeira. O sapateiro, na ânsia de tomar cachaça na taverna do
português, por ocasião da festa do Divino Espírito Santo, não obteve sucesso,
já que a mesma encontrava-se fechada. Aos brados e murros, já alcoolizado,
Capanema passou aos insultos dizendo: “estes branquinhos do Reino que nos
querem tomar nossas terras, cedo os haveremos de botar fora dela.” O sapateiro
foi denunciado pelos que presenciaram o fato, entre eles o escrivão Antônio da
Costa Braga e o Capitão Bernardo José Gomes da Silva Flores. Sendo inquirido
pelo desembargador e ouvidor, foi preso em 22/09/1790. Foi, em 22/01/1791,
remetido para o Rio de Janeiro em companhia de José Martins Borges e Vitoriano
Gonçalvez Veloso. Finalmente foi absolvido, depois de mais de dois anos de prisão.
Nesta mesma diligência foi ouvido Joaquim Pedro de Sousa Câmara, moço fidalgo
da casa de sua majestade e sargento-mor da Cavalaria de Auxiliares da Comarca
do Rio das Mortes e residente em Matosinhos. O assunto foi uma suposta carta
enviada de Portugal por sua prima, Joana de Menezes e Valadares, alertando-o
sobre um levante que haveria de acontecer nestas Minas Gerais. O assunto da
referida carta foi ventilado pelo Coronel Francisco Antônio de Oliveira Lopes,
num de seus depoimentos. Joaquim Pedro declarou que a intenção da missiva de
sua prima tinha apenas intento de convencê-lo a regressar para a Corte, onde
poderia viver com mais segurança ao lado de Sua Majestade. A carta foi enviada
ao Governador Visconde de Barbacena e Joaquim Pedro não mais foi molestado
pelas autoridades. Outro personagem envolvido na trama da Inconfidência Mineira
e que posteriormente passou a residir em Matosinhos, onde faleceu, foi o
célebre mestre de campo e grande potentado da época, Inácio Correa Pamplona.
Era português, natural da Ilha Terceira. Vindo para o Brasil, estabeleceu-se
nas Minas Gerais, fez grande fortuna, tornou-se latifundiário. (...) era amigo particular do Pe. Carlos Correia de Toledo, vigário da Vila
de São José e, talvez por isto, chegou a se comprometer discretamente com a
conjuração. Foi o terceiro delator da Inconfidência. No fim da vida, já
bastante idoso e doente, a procura de mais fáceis recursos da medicina,
adquiriu uma chácara em Matosinhos, onde veio falecer em 1810. (...) Outra moradora de Matosinhos relacionada
indiretamente com a Inconfidência Mineira foi Maria Angélica de Sá Meneses,
segunda esposa do Cel. Carlos José da Silva, escrivão da Junta Real da Fazenda,
homem de confiança do Visconde de Barbacena e do vice-rei.
No arquivo do Museu Regional do IPHAN, em São
João del-Rei, existe uma carta [1], parte do testamento do
coronel Pamplona, dirigida a seu filho sacerdote, padre Inácio Correia Pamplona
Corte Real, datada de 21 de abril de 1810, assinada na sua chácara em
Matosinhos, onde o próprio coronel sertanista revela que estava atormentado por
visões espirituais, assombrações, barulhos, como que prenunciando sua morte.
Veja-se por exemplo este trecho:
E quanto aos meus ouvidos e as representações de espetáculos que todas
as horas se me representam, lhes não posso explicar. E eu as recebo por
misericórdia e por aviso do céu. Sábado dia 14 pelas 9 horas da noite, entrou a
tempestade nesta chácara, de sorte até se representavam serpentes de arrasto
pelo sobrado, e até o dia de hoje 21 sábado de manhã tem os invisíveis
continuado de noite e de dia e as horas que querem.
Pamplona ansioso,
vendo fantasmas e pressentindo a morte, se despediu do filho, recomendando
cautela com aqueles tais demônios.
Notas e Créditos
* Texto: Ulisses Passarelli
[1] -
Arquivada na caixa 100. Cópia da transcrição gentilmente cedida por Luís
Antônio Sacramento Miranda.
Nenhum comentário:
Postar um comentário